sexta-feira, 22 de maio de 2009

Como uma vela

Ela chegou para me buscar. Não estava com aquele sorriso radiante de sempre, nem ao menos fez as perguntas tradicionais com aquela mesma empolgação. Mas eu a via tentando parecer normal, tentando não me preocupar. Uma pena que os olhos nunca mintam. Fingi acreditar naquele fingimento e, então, andamos em silêncio, lado a lado, até eu ver uma gota no chão. Não estava chovendo. Era uma gota solitária, só ela só, espatifada naquele concreto frio e seco - uma lágrima, uma das poucas que eu vira em 15 anos.
- Mãe, está tudo bem?
- Hm... Mais ou menos.
- O que aconteceu? - Meu coração já havia disparado. "Mais ou menos" nunca me tranquilizam.
- Levei seu avô no médico hoje, e aquele probleminha voltou.
- Mas tem como curar, não?
- Teria... Mas submetê-lo a outra cirurgia é muito arriscado.
- Isso quer dizer que...? - Eu sabia o que significava, apenas não queria acreditar.
- Q-que...
- Que?
- ...que ele vai "apagar", como uma vela. - A essa altura, seu rosto já estava encharcado. Eu não sabia o que dizer para confortá-la, nem sentia-me confortável para isso. Apenas senti aquelas palavras chocando-se contra mim, tentando derrubar-nos. Então, peguei sua mão e continuamos andando em silêncio, lado a lado, com várias gotas no chão. Apenas o que ouviamos era o baque surdo dos nossos passos naquela noite vazia. Ainda não chovia. Mas aquela gota deixara de ser solitária, e muitas outras estavam estateladas no concreto frio e não mais tão seco - lágrimas minhas e dela, juntas, assim como seria dalí para frente.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Ao canto de um salão vazio.

A festa estava acontecendo. Eu ouvia aquele som alto que vinha de longe, e as vozes das pessoas que passavam alí por perto. Mas não queríamos partilhar daquela felicidade. Queríamos partilhar a nossa, queríamos o nosso momento. A sós. Só nós. Sentados no canto de um salão vazio, com os dedos entrelaçados e o coração pulsando.
Achei que demoraria mais para interessar-me por alguém novamente. Achei que nunca encontraria alguém que me entendesse. Achei que meu rosto não coraria mais, e que não sentiria arrepios a ponto de estremecer minhas pernas. Mas talvez ter parado de procurar mostrou-me o que eu não conseguia ver: o que eu procurava estava bem ao meu lado, eu apenas não abrira os olhos.
Ele olhava-me e eu via que estava fazendo a coisa certa depois de tanto tempo. Ele beijava-me e eu voltava a sentir o que não sentia a meses. Ele falava, e eu ouvia o que estava precisando para me tranquilizar.
- Já que você quer tanto parar o tempo, vou tirar meu relógio e desligar o celular. Agora somos só eu e você aqui, e nada mais importa.
Encostei meu rosto em seu ombro, e embriaguei-me com o perfume que vinha de seu pescoço.
Estava tudo perfeito - até o cheiro.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Pilhas do relógio

Nos últimos dias as coisas parecem ter fugido do meu controle. Tudo o que eu estava orgulhosa por estar conseguindo dominar escorregou por entre meus dedos, como se tentasse segurar areia. Muitas coisas a fazer, pouco tempo. Nem passar madrugadas em claro ajudaram-me a tomar novamente o controle.
Talvez tenha sido um erro querer assumir compromissos demais. Talvez o certo fosse, na verdade, passar tardes e tardes apreciando o calor das minhas cobertas, com uma boa xícara de café e bolachas recheadas, mesmo que isso não cobrisse a necessidade insaciável que tenho de superar-me sempre. Uma pena que eu não consiga suportar tanto quanto eu pensava.
Então, aquela areia que eu tentava segurar parece ter me soterrado. Competi incessantemente contra o relógio, o qual sempre conseguia dar um jeito de ultrapassar-me e fazer-me perder todas a disputas. Descabelei-me. Perdi totalmente o controle. Meus olhos doíam, minha cabeça girava, toda essa preocupação e minha angústia foram levadas para meu canal lacrimal.
Faz três dias que abafo meus choros durante o dia e tento parecer feliz, pois as pessoas não merecem partilhar comigo minha tristeza. Mas é a noite, sozinha no meu quarto escuro, que me sinto realmente segura e permito-me revelar tudo o que sinto. Eu não deixei de ser uma garotinha. Eu não suporto tudo isso. Queria poder voltar à minha infância - é uma pena que mesmo tirando as pilhas do relógio, não consiga parar o tempo.

domingo, 3 de maio de 2009

História de novela

Faz tanto tempo que não o vejo que nem lembro mais de suas feições. Apenas o que me vem na cabeça são vagas imagens congeladas que vi nas fotografias. Sem mais notícias, nenhuma explicação. Nem ao menos lembro a quanto tempo o vi pela última vez - sete ou dez anos, talvez.
Sei que está vivo por ouvir seu nome e os problemas que causou, ou ainda causa. E talvez tenhamos nos cruzado pela rua, mas ele não me reconhecera - eu ao menos tive aquela impressão "conheço-este-rosto...". Porém, orkut não me parecia o meio mais provável de nos revermos: "que bom que me adicionou, agora podemos manter contato". Manter contato agora? Depois de já ter crescido sem desculpas por ter desaparecido? Depois de não ter me desejado feliz natal no fim do ano, nem estado comigo nos últimos 7 aniversários? De não ter me dito "cuidado com os homens, eles não prestam" quando dei meu primeiro beijo?
Percebi que sobrevivo sem um padrinho. E talvez o silêncio, agora, seja o melhor contato.